Legalização do Aborto
Para nós da AMB, a luta pela legalização do aborto é parte da luta pela consolidação e ampliação da democracia, uma vez que a nossa autodeterminação reprodutiva deve ser entendida como um direito a ser assegurado em uma sociedade onde sejamos verdadeiramente livres. A legalização do aborto, sobre a perspectiva da justiça reprodutiva, é uma luta fundamental para a garantia da dignidade e da liberdade das mulheres e para a construção de uma sociedade mais justa.
A gravidez forçada é uma forma de tortura física e psicológica, que agride as mulheres e retira o nosso direito de escolher a vida que queremos viver. Por isso, entendemos a criminalização do aborto também como uma violência contra as mulheres. Sabemos que essa criminalização não se dá da mesma forma na vida de todas nós. Ela reproduz e intensifica o racismo, as desigualdades regionais e de classe, que estruturam a nossa sociedade. Desta forma, na nossa luta, temos articulado as discussões sobre o direito ao aborto à luta por justiça social e contra o racismo.
Ao longo de toda a nossa história, temos contribuído para o debate e a luta pelo direito ao aborto seguro no Brasil buscando “ganhar mentes e corações” das mulheres para aumentar nossa força feminista nessa trincheira e popularizar o debate, livre de preconceitos e julgamentos morais, que só empurram as mulheres para a ilegalidade.
Entre 2004 e 2008 a AMB integrou as Jornadas Brasileiras pelo Aborto Legal e Seguro, espaço onde construímos estratégias de comunicação e realizamos diversas ações coletivas como pesquisas, intercâmbios entre diferentes regiões, debates públicos e espaços formativos. Promovemos várias ações e incidências no Congresso Nacional. Em 2006 participamos, através da nossa representante no CNDM, da Comissão Tripartite, criada com o objetivo de rever a legislação punitiva ao aborto no país.
Em 2008, fomos uma das organizações protagonistas na articulação e construção da Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, espaço de resistência, diálogo e pactuação entre movimentos feministas sobre os caminhos da luta. Através da Frente Nacional, desenvolvemos ações como as mobilizações contra o Estatuto do Nascituro (PL 478/2007); a defesa do aborto como questão de Direitos Humanos das mulheres nas Conferências de Direitos Humanos e no PNHD-3 em 2010; fizemos a crítica ao Sistema de Cadastro Compulsório de Gestante (MP-MS 557/2012); em 2013, resistimos à instalação da CPI da Fogueira, que pretendia investigar o financiamento à luta pela legalização do aborto no Brasil; e somamos força na grande mobilização contra o PL 5069/2013, que pretendia anular o direito ao aborto em todos os casos, luta que deu base para a campanha Fora Cunha e esteve na origem da chamada Primavera Feminista.
Entre 2008 e 2014, a Frente Nacional elaborou o Dossiê sobre a criminalização das mulheres por aborto, que tinha como objetivo oferecer um instrumento para atuação crítica às nossas parceiras e parceiros nesta luta. Em 2016 realizamos duas viradas online #PrecisamosFalarSobreAborto. Em 2017, como ação de fortalecimento da Frente, a AMB impulsionou um processo de articulação contra os ataques legislativos. Fizemos um levantamento de todos os projetos e propostas legislativas que significavam retrocessos para os direitos de todas as mulheres, considerando raça, classe e gênero. Lançamos uma convocatória para que organizações e coletivos feministas aderissem a uma ampla articulação, com o objetivo de denunciar, desmoralizar e derrotar esses ataques, não somente no Congresso Nacional, mas também nas Assembleias Legislativas estaduais e nas Câmaras de Vereadores.
Fruto deste processo, em agosto do mesmo ano, foi lançado o Alerta Feminista, contando com o apoio de mais de 200 organizações e movimentos. Este documento elenca os ataques legislativos à dignidade, aos direitos sexuais e direitos reprodutivos das mulheres, aos Direitos Humanos da população LGBT e do povo negro. O Alerta Feminista circulou entre organizações e movimentos nacionais, na mídia e nas redes sociais e se transformou em uma comunicação periódica, distribuída a todas as organizações signatárias com o intuito de informar sobre os ataques legislativos em curso. O Alerta tem sido uma ferramenta importante em momentos de avanço de propostas conservadoras na Câmara.
Em 2017, também fomos parte da força feminista que levou às ruas milhares de mulheres em mais de 30 cidades brasileiras na ação #TodasContra18, em resposta à aprovação do relatório favorável à PEC 181, que pretendia impedir o abortamento por decisão da mulher em quaisquer circunstâncias. Na sequência, começamos a articulação de uma Carta Aberta ao Parlamento Brasileiro. Essa Carta foi entregue à Comissão Especial e ao então presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia, que acabou por fazer uma declaração pública de que a PEC não tramitaria.
No difícil ano das eleições gerais de 2018, nos mantivemos vivas na causa do aborto e contribuímos com a realização do Festival pela Vida das Mulheres, convocado e fortalecido pela Frente para reverberar a audiência pública no STF da ADPF 442 (iniciativa apoiada por várias organizações). Somamos nossas forças a de outras companheiras e realizamos Festivais em capitais do nordeste (Recife, João Pessoa, Natal) ao mesmo tempo que sustentamos a infraestrutura e a metodologia do Festival do Distrito Federal. Às vésperas do 2º turno das eleições, repetimos a ação do Festival em algumas outras capitais, no 28 de setembro, Dia Latino-americano pela Legalização do Aborto, que naquele ano foi véspera do #EleNão, momento no qual levamos também a bandeira da legalização do aborto.
Em 2020, atentas aos atos do governo Bolsonaro, junto com a FNPLA enfrentamos repetidos ataques, que agora não se limitam mais ao legislativo, sinalizando um novo momento do projeto anti-abortista que tem como sua maior representante a ministra Damares Alves. No 28 de setembro a Frente Nacional realizou uma grande live que conectou todas, todos e todes que constroem essa luta no Brasil.
Diante do crescente conservadorismo e avanço de setores religiosos fundamentalistas, seguimos firmes na luta para defender todos os direitos conquistados até aqui e para seguir avançando nas discussões que fortalecem a nossa luta por liberdade e justiça reprodutiva. Seguimos em frente, fortalecendo as alianças com movimentos feministas e de mulheres em diferentes partes do Brasil e da América Latina e lutando pela nossa autonomia.
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