Carta de Princípios

Com o objetivo de orientar e aperfeiçoar permanentemente os modos de atuação, organização e funcionamento da AMB, a XIII Reunião Nacional do Comitê Político (fevereiro, 2008) aprovou que fosse estabelecida esta Carta, com base nas proposições resultantes do ciclo de reuniões regionais realizadas no ano de 2003 e nas propostas político-organizativas debatidas nos grupos de trabalho e apresentadas no painel final do Encontro Nacional da AMB de 2006. (Goiânia-GO).

Os Princípios contidos nesta Carta devem ser respeitados por todas as mulheres e organizações feministas que participam da Articulação de Mulheres Brasileiras, consolidando as diretrizes e compromissos que têm pautado a sua prática política desde a fundação.

A AMB é uma organização política feminista, antirracista, não partidária, instituída em 1994 para coordenar as ações dos movimentos de mulheres brasileiras com vistas à sua consolidação como sujeito político no processo da IV Conferência Mundial sobre a Mulher – Igualdade, Desenvolvimento e Paz (ONU, Beijing, 1995). O Encontro Nacional de 1994 reuniu mais de 700 mulheres de todo o país, no Rio de Janeiro, e marcou o ápice desta que foi a primeira fase da AMB.

No período pós-Beijing, a AMB afirma-se no campo dos movimentos sociais como uma organização que articula e potencializa a luta feminista das mulheres brasileiras nos planos local, nacional, latino-americano e internacional.

A AMB estabeleceu e mantém compromisso com a luta antirracista, com o reconhecimento e fortalecimento do feminismo negro, o respeito à diversidade étnica e a luta contra o etnocentrismo, defendendo a autodeterminação dos povos.

A AMB posiciona-se como articulação feminista anticapitalista, por compreender que dentro deste sistema, especialmente em seu estágio atual de mundialização do capital e hegemonia da sociedade de consumo, é impossível conquistas significativas na direção da igualdade e autonomia para todas as mulheres, uma vez que este sistema concentra riqueza, provoca crescente exclusão com aumento do empobrecimento e crises socioambientais.

Sendo uma organização antipatriarcal, a AMB defende a liberdade afetiva e sexual de todas as pessoas, contrapondo-se à norma patriarcal da heterossexualidade e à prática da lesbofobia.

A AMB defende o direito à autodeterminação reprodutiva para as mulheres e o direito ao aborto. Condena a exploração e mercantilização de nosso corpo e sexualidade.

No mundo do trabalho, a AMB luta pela superação da divisão sexual do trabalho e pela proteção social universal a todas as mulheres. Almeja o trabalho livre da lógica de acumulação capitalista das riquezas, orientado para a satisfação das necessidades de todas as pessoas e não para o lucro e a vantagem particular.

Atua para construção de uma outra economia, com divisão do trabalho justa e democrática, políticas redistributivas das riquezas produzidas e que garantam a autonomia econômica para todas as mulheres, no campo, na floresta e nas cidades.

A AMB atua para democratização do sistema político e das formas de exercício do poder no Estado e na sociedade, e mantém-se comprometida em alterar a cultura política patriarcal e racista e na defesa da laicidade do Estado, desenvolvendo novas concepções e práticas de fazer política.

A AMB combate todas as formas de violência e luta pelo fim da violência contra as mulheres, seja em espaços institucionais ou nas relações interpessoais. Mantém-se na defesa sem trégua da autonomia e liberdade para as mulheres.

No presente, a AMB define como seus objetivos permanentes:

  • Promover a auto-organização das mulheres e de seus movimentos como sujeitos políticos da  luta contra a dominação, opressão e exploração das mulheres, e da luta por transformação  social;
  • Lutar pela democratização radical do Estado no Brasil e por Estados democráticos na América  Latina cujas políticas públicas,estando sob controle social da população em todos os níveis de  governo, efetivem igualdade de direitos e boas condições de vida para as mulheres, garantindo solidariedade e promovendo justiça social, econômica e ambiental, contrapondo-se à perspectiva neoliberal nos processos de desenvolvimento da economia capitalista na região;
  • Lutar pela democratização radical da vida social e dos sistemas políticos, construindo uma  cultura política democrática no Brasil e nos outros países da América Latina, cujas práticas e  relações sociais, nos espaços públicos e privados, garantam e promovam um ambiente de  liberdade para as mulheres para que possam ter uma vida com direito à participação política  plena, direito à autonomia e vida sem violência.

São princípios organizativos da AMB:

  • Unidade na diversidade, princípio concretizado no compromisso com a autonomia organizativa  e política dos fóruns, redes e articulações estaduais que integram a AMB, e com o debate  democrático das perspectivas teórico-políticas que orientam sua prática; 
  • Democracia interna pautada numa institucionalidade não burocrática; relações e processos  decisórios horizontais e participativos marcados pela produção de consensos na ação; tomada  de decisão por consenso com base em ampla maioria (2/3) e respeito ao direito de minoria de  modo a tornar sempre possível rever decisões majoritárias;
  • Diálogo, articulação e livre adesão como método de organização das lutas feministas na AMB e  nas lutas coletivas organizadas com outras redes e articulações do feminismo e do movimento  de mulheres brasileiro e internacional; 
  • A AMB reúne, articula e é integrada por mulheres feministas que atuam, em seus diferentes  espaços de participação, em nome próprio ou por meio da representação de organizações e  movimentos feministas, setoriais de mulheres de movimentos sociais e/ou setoriais de  mulheres de partidos políticos; 
  • Toda ação e modo de funcionamento da AMB orienta-se pelo fortalecimento do movimento de  mulheres e feminista. Isto significa atuar de modo a garantir apoio à auto-organização das  mulheres por todo o país, em especial o fortalecimento das instâncias estaduais do movimento  de mulheres vinculadas à AMB, nos contextos de suas intervenções, locais e regionais; 
  • AMB orienta-se para o fortalecimento do campo democrático popular dos movimentos sociais,  buscando de forma permanente estabelecer alianças e engajamento nas lutas sociais da  América Latina, aprofundar os laços entre mulheres feministas de distintos movimentos sociais e fortalecer o caráter contra-hegemônico da luta feminista;
  • Para afirmarem-se e serem reconhecidas como militantes da AMB, todas as mulheres e  organizações que atuam em alguns dos espaços de participação e fóruns decisórios da AMB  assinam esta Carta, mantêm-se comprometidas com o fortalecimento do modo de organização  da AMB e contribuem efetivamente para a realização da sua Política Geral.

XIII Reunião Nacional do Comitê Político da AMB. llha de Itaparica, Bahia, 2008