Carta Aberta do Diálogos pela Democracia
Nós, organizações e movimentos da sociedade civil, abaixo-assinadas, apresentamos algumas considerações, preocupações e demandas urgentes ao Congresso Nacional legislatura 2023/27.
Somos organizações do campo da defesa dos Direitos Humanos e atuamos em diversas agendas e lutas, tais como: socioambientais, territoriais, segurança alimentar e nutricional, educação, saúde, afirmação da diversidade religiosa e cultural, mulheres, população LGBTQIA+, juventudes, população negra, quilombolas, ribeirinhos, povos originários, sem-terra, sem-teto, pessoas com deficiência, população em situação de rua, população do campo e da cidade, no combate as desigualdades, direito a comunicação e na defesa da democracia. Nossa atuação visa essencialmente a construção de um país radicalmente democrático.
Nos últimos quatro anos, sobrevivemos para resistir e resistimos para existir. Nos organizamos nos territórios para acolher o povo durante a pandemia da Covid-19. Foram tempos de terror e perversidade, pois sabemos – e a CPI da Covid comprovou – que os mais afetados pela gestão criminosa da pandemia foram as mulheres, em especial as mulheres negras, os/as profissionais da saúde, a população negra, em situação de rua, indígena e quilombola. Criamos barreiras nos territórios tradicionais para evitar a chegada do vírus e atuamos em redes de solidariedade para garantir o acesso a máscaras, materiais de higiene, remédios e comida para o povo. Trabalhamos na linha de frente pelo Auxílio Emergencial, realizamos atos inter-religiosos em memória das vítimas da Covid-19 e acolhemos a dor das famílias enlutadas. Assim vivemos o nosso luto por mais de 695 mil mortes, a maioria evitáveis.
Na campanha eleitoral de 2022, a população negra, as juventudes, as mulheres e a população LGBTQIA+, das amplas periferias deste País, tiveram papel fundamental, tanto no enfrentamento da extrema direita, como na construção e eleição de candidaturas que expressam essas lutas, ou porque conseguiram animar a consciência social com o esperançar de um Brasil melhor. Enfrentamos a violência política com nossos corpos e a solidariedade de nossos movimentos. Verificamos, na luta, que é necessária e urgente a reforma do sistema político, visto que as alterações na legislação eleitoral têm sido realizadas para fortalecer ainda mais o poder oligárquico e econômico.
Sem menosprezar a conquista de algumas cadeiras a mais no Congresso e nas Assembleias, a representatividade de mulheres, dos negros e negras, indígenas, quilombolas e juventudes está muito aquém do desejável numa democracia. Este parlamento precisa urgentemente enfrentar o debate da sub-representação desses segmentos nos espaços de poder. Sem isso, nunca seremos uma democracia plena.
Fizemos a campanha e votamos na Frente Ampla (amplíssima) simbolizada pela candidatura Lula/Alckmin, pois sabíamos que seria a melhor opção para o Brasil. Entendemos a necessidade da construção de uma força política ampla para enfrentar os perigos do fascismo e assim assegurar um ambiente político seguro para fazermos as nossas lutas.
Na plenária que realizamos nos dias 10 e 11 de novembro de 2022, construímos o consenso de que é preciso que o novo parlamento compreenda ser a defesa da democracia um projeto, não um dado objetivo alcançado após uma eleição. Serão anos difíceis, e nós seremos a base de apoio desse projeto. Assim, consideramos que – em um processo de concertação – é fundamental demarcar o campo de negociações. Afinal, na nossa história sempre que tivemos esses processos de “concertação” os setores oligárquicos, financeiros e empresariais, com a direita e com setores fundamentalistas das igrejas, os interesses dos mais pobres, da população negra, das mulheres, da população LGBTQIA+, dos povos originários, das pessoas com deficiências e demais segmentos das classes trabalhadoras foram os primeiros a serem rifados e excluídos.
Lembramos que a retirada de direitos e a política de morte perpassa toda a nossa história. Agora basta! Queremos o compromisso deste parlamento com os direitos humanos e com a efetivação de nossos direitos econômicos, políticos, sociais, culturais e ambientais. Este parlamento precisa se comprometer, a não retroceder nas leis brasileiras e nos acordos internacionais que garantem direitos aos povos originários e às comunidades tradicionais, à população negra, às mulheres, às pessoas com deficiências, aos povos das florestas, às comunidades quilombolas e de Terreiros, às pessoas LGBTQIA+, às trabalhadoras e aos trabalhadores. Importa que assuma, também, o compromisso com o desencarceramento em massa e com a adoção de uma política de drogas mais consequente, pondo fim ao genocídio e à brutal criminalização que devasta as vidas das juventudes e das mulheres e homens negros, periféricas e empobrecidas em todo o País.
O caminho para a constituição do Estado laico e de respeito a todos os sagrados devem ser ampliado e percorridos sem privilégios nem exclusões. É preciso ter em mente que a baliza do Estado Democrático de Direito é a Constituição da República, não os textos das religiões.
Não há como construir a trajetória da democracia plena sem construir debates públicos efetivos e políticas públicas que garantam a participação social nos processos decisórios, incluindo os relacionados às finanças públicas, além de democratizar a comunicação e garantir direitos digitais a toda população. Quanto mais aberto o parlamento mais democracia temos. Por isso, impõe-se não só dar fim ao Teto de Gastos e rever as demais regras fiscais, como ainda revogar imediatamente todos os decretos e atos normativos infralegais que desvirtuam e limitam os direitos e a execução de políticas públicas de direitos. O Parlamento tem um papel fundamental nisso e por isso reivindicamos a abertura de espaços de interlocução do parlamento com a sociedade, além do que já temos. Urgente rever as práticas do parlamento durante a pandemia, inclusive a questão do acesso a casa e as votações remotas.
Ademais, urge responsabilizar todos aqueles que cometeram crimes contra a vida e a democracia nesses últimos anos de ameaças, particularmente os agentes públicos. Neste sentido não aceitamos qualquer projeto que possa vir anistiar quem for declarado culpado tanto pela gestão da pandemia como dos atos antidemocráticos. É necessário e urgente a desmilitarização do Estado e da política.
Não aceitaremos nenhum passo atrás nas nossas conquistas. Foram décadas de lutas, com muito sofrimento e mortes. Precisamos resgatar e construir novos direitos trabalhistas previdenciários, bem como os meios de existência das organizações sindicais e populares. A juventude merece ter esperança no futuro, sem trabalho precarizado, sem a exaustão de empregos informais e com a garantia de uma previdência social digna e de educação de qualidade. Mulheres e homens precisam receber a mesma remuneração por igual trabalho. A saúde de todas, todes e todos deve ser garantida, por meio de medidas que incluam jornadas de trabalho decentes, investimentos no Sistema Único de Saúde e respeito aos direitos sexuais e reprodutivos. A justiça reprodutiva precisa ser uma agenda central nesta legislatura.
A democracia que queremos é inclusiva, generosa, caracterizada pela justiça social e que enfrente o racismo, patriarcado e todas as formas de opressão. Os compromissos que buscamos junto ao novo parlamento são a base para a sua construção e um aceno verdadeiro da chegada da primavera.
Brasília, 27 de fevereiro de 2023.
Organizações que assinam a carta:
6ª Semana Social Brasileira;
Abong – Associação Brasileira De Ongs;
AFIPEA – Sindicato Nacional Dos Servidores Do IPEA;
Aliança Nacional LGBTI+;
Associação De Vítimas E Familiares De Vítimas Da Covid-19 – Avico Brasil;
Associação Escola Sem Muros Grupo Eco;
Associação Filhos De Aruanda;
AMB – Articulação De Mulheres Brasileiras;
Articulação Brasileira Pela Economia De Francisco E Clara;
Articulação Nacional Das Mulheres Indígenas, Guerreiras Da Ancestralidades – ANMIGA;
Articulação Brasileira De Indígenas Antropóloges- ABIA;
Articulação De Mulheres Negras Brasileiras;
Ação Social Franciscana – SEFRAS;
ABPN – Associação Brasileira De Pesquisadores/As Negros/As;
AMIAJ Articulação De Mulheres Indígenas Da Aldeia;
ANDA – Agência De Notícias De Direitos Animais;
Agentes De Pastoral Negros Do Brasil APNS;
Articulação Para O Monitoramento Dos Direitos Humanos No Brasil – AMDH;
Católicas Pelo Direito De Decidir;
Casa Laudelina De Campos Mello – Organização Da Mulher Negra;
Candaces – Rede Nacional De Lésbicas E Bissexuais Negras Feministas Autônomas;
Campanha Nacional Pelo Direito À Educação;
CEPIA – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação E Ação;
CEERT – Centro De Estudos Das Relações De Trabalho E Desigualdades;
CEARAH Periferia;
CESE- Coordenadoria Ecumênica De Serviço;
CEAP – Centro De Educação E Assessoramento Popular;
Centro De Defesa Da Vida Herbert De Sousa;
Centro De Educação E Assessoramento Popular;
Centro Palmares De Estudos E Assessoria Por Direitos;
Centro Popular De Direitos Humanos – CPDH;
CEB Diácono Pedro Bettin;
Centro De Estudos E Defesa Do Negro Do Pará – Cedenpa;
Centro Palmares De Estudos E Assessoria Por Direitos;
CESE – Coordenadoria Ecumênica De Serviço;
COAR;
Coletivo Iya Akobiodé;
Conselho Pastoral Dos Pescadores – CPP-BA/SE;
Cunhã Coletivo Feminista;
Conselho Nacional De Igrejas Cristãs Do Brasil;
Coalizão Negra Por Direiros;
Coalizão Pela Socioeducação;
CONSELHO NACIONAL DO LAICATO DO BRASIL – CNLB;
Cfemea – Centro Feminista de Estudos e Assessoria;
Comitê Dos Povos E Comunidades Tradicionais Do Pampa;
Cordel – Coletivo Revolucionário De Libertação;
CPP-ES;
Congregação Das Filhas Do Coração Imaculado De Maria;
Comitê Latino-Americano E Do Caribe Para A Defesa Dos Direitos Das Mulheres – CLADEM;
CNLBN3;
Conselho Nacional Do Laicato Do Brasil – CNLB;
Conselho Nacional Do Laicato Do Brasil – CNLB-REG.NE3;
Conselho Nacional Do Laicato Do Brasil – CNLB/MANAUS- Cebs;
Comissão Regional Justiça E Paz Do MS (CRJPMS);
CDHEP – Centro Dos Direitos Humanos E Educação Popular De Campo Limpo;
Comissão Regional Justiça E Paz Do MS (CRJPMS);
Comissão De Direitos Humanos De Passo Fundo – CDHPF;
CDHEP – Centro Dos Direitos Humanos E Educação Popular De Campo Limpo;
CBJP – Comissão Brasileira Justiça E Paz;
Criola;
DIAP – Departamento Intersindical De Assessoria Parlamentar;
Diálogo Pela Democracia;
Dicionário De Favelas Marielle Franco;
Elas No Poder;
EQUIP Escola De Formação Quilombo Dos Palmares;
EMERGE – Centro De Pesquisas E Produção Em Comunicação E Emergência;
Etnioka – Associação Internacional De Desenvolvimento Étnico E Ambiental;
Escola Livre De Redução De Danos;
Edupovo – Educação Popular;
FAOR – Fórum Da Amazônia Oriental;
Fenatrad – Federação Nacional Das Trabalhadoras Domésticas;
Frente De Mulheres Negras DF E Entorno;
Fórum Paraibano De Luta Da Pessoa Com Deficiência;
Fórum Nacional De Prevenção E Erradicação Do Trabalho Infantil- FNPETI; Fundação Luterana de Diaconia – Conselho de Missão entre Povos Indígenas-Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia (FLD-COMIN-CAPA);
FONSANPOTMA – Fórum Nacional De Segurança Alimentar E Nutricional Dos Povos;
FIRE – Fórum Inter-Religioso E Ecumênico Do RS;
FAOR Fórum Da Amazônia Oriental;
Fórum Justiça;
Geledès Instituto da Mulher Negra;
GTP+ Grupo De Trabalhos Em Prevenção Posithivo;
Grupo Curumim Gestação e Parto;
Grupo De Mulheres Negras Malunga;
Grupo Internacional Seminário Permanente Mundos Indígenas;
Grito Dos Excluídos Continental;
ISPCA, – Instituto São Paulo De Ciências Aplicadas;
Igreja Católico Anglicana Latino Americana;
Inovacom/ PPGCOM;
Instituto Regenerativo Tempo De Plantar;
Instituto Alziras;
Instituto Curicaca;
Instituto Vladimir Herzog;
Instituto Ecovida;
Instituto Raízes Em Movimento;
Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC;
Instituto De Fiscalização E Controle;
Instituto Prios De Políticas Públicas E Direitos Humanos;
Instituto Soma Brasil;
Intervozes – Coletivo Brasil De Comunicação Social;
Jubileu Sul Brasil;
KOINONIA Presença Ecumênica E Serviço;
Laboratório De Pesquisas Sobre Ação Pública Para O Desenvolvimento Democrático – LAP2D/Unb;
Mulherio Das Letras Indígenas;
MANXINERUNE TSIHI PUKTE HAJENE – MATPHA;
Movimento Mulheres Negras Decidem;
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH Brasil);
Nem Presa Nem Morta por Aborto;
Nzinga – Coletivo De Mulheres Negras;
Nepps – Núcleo De Estudos De Políticas Públicas Elza De Andrade Oliveira;
Núcleo Piratininga De Comunicação;
OSC MULHERES GUERREIRAS DE CAMARAGIBE;
Oxfam Brasil;
PAD;
POLÍTICA VIVA;
Plataforma Política;
Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político;
PT/DF;
Pastoral Nômades / Povos Ciganos;
Pastoral Da Pessoa Idosa;
Partido Dos Trabalhadores Balneário Pinhal RS;
Pastoral Da Juventude Do Meio Popular;
Pólis – Instituto De Estudos, Formação E Assessoria Em Políticas Sociais;
Rede Nacional De Combate À Desinformação;
Rede Justiça Criminal;
Rede Afro LGBT;
REDE SAPATÀ; Redeh – Rede de Desenvolvimento Humano;
Rede Brasileira De Conselhos -RBDC;
Rede Nacional De Feminista Antiproibicionista – RENFA;
Rede Nacional De Combate À Desinformação;
REDEH – Rede De Desenvolvimento Humano;
Rede de Mulheres Negras de Pernambuco;
Rede Cearense De Socioeonomia Solidaria;
RFS REDE FEMINISTA DE SAUDE, DIRRITOS SEXUAIS E DIREITOS REPRODUTIVOS;
Setor De Educação Do MST;
SOS Corpo Instituto Feminista Para A Democracia;
Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais – Sind Ute MG;
Setorial Dos DH PT/RS;
Secretaria De Mulheres PTDF;
Themis – Gênero Justiça E Direitos Humanos;
Tv Cidadania 103.5 Gente É Para Brilhar;
Terra De Direitos;
UFPA;
VoteLGBT;
Zanzalab;