Câmara dos Deputados quer barrar avanço das mulheres na política

A Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político vê com preocupação a possibilidade de votação da proposta de emenda à Constituição (PEC 134/15) que reserva um percentual baixíssimo de vagas para mulheres nos espaços legislativos municipais, estaduais e federais. A política institucional é historicamente marcada por uma cultura machista e racista que não abre espaço para a diversidade de perspectivas nas decisões e temas tratados na esfera pública.

A proposta prevê a reserva de cadeiras para mulheres a partir de 10% de cota mínima na primeira legislatura, com aumento para 12% na legislatura seguinte e 16% na terceira legislatura, a partir da aprovação da PEC. Pelo texto proposto, caso o percentual determinado não seja atingido através do voto direto, as vagas serão preenchidas, dentro de cada partido, por candidatas que tenham obtido a maior votação nominal entre os partidos que atingiram o quociente eleitoral. O resultado das eleições de 2020 trouxe um pequeno aumento na representação de mulheres no legislativo, de 13,5% para 16%, das quais menos da metade são mulheres negras, que representam 6,3% dos eleitos (Fonte: TSE, 2020).

O estabelecimento de cotas femininas nos espaços legislativos é uma iniciativa importante para enfrentar a sub-representação das mulheres nos espaços de poder. Mas a proposta da PEC é uma armadilha , pois não corresponde à média de representação que as mulheres já garantiram, com muita luta, nos últimos anos. De acordo com o TSE, por exemplo, em 17 capitais mais de 16% de mulheres foram eleitas para as casas parlamentares em 2020. Nenhuma proposta que não parta da paridade entre os sexos pode ser considerada como satisfatória.

Ademais, a referida PEC não enfrenta as demais sub-representações, como do povo negro e povos indígenas. Em relação à questão racial, defendemos que os espaços legislativos precisam ser paritários entre negros/as e não negros/as. Por exemplo: entre os 50% de mulheres, metade de mulheres negras e metade de mulheres não negras. No que se refere à representação dos povos indígenas, é urgente que o Congresso Nacional estabeleça um processo de diálogo com as organizações que representam estes povos para construir uma proposta de representação nos espaços de poder.

Entendemos que isso é o início de um processo para enfrentar as sub-representações nos espaços de poder. Não podemos esquecer da população LGBTI+, das juventudes periféricas, dos povos das águas e das florestas, dos/as trabalhadores/as, do povo do campo, e do efeito perverso da sub-representação, que é a violência política contra esses segmentos (incluindo mulheres, cis e trans).

Em uma tentativa de mostrar preocupação com os direitos das mulheres, a Câmara dos Deputados se precipita e propõe votar nesta semana – no apagar das luzes da atividade legislativa de 2020 – um conteúdo insuficiente para a ampliação de fato da participação política das mulheres, sem nenhuma discussão mais ampliada com o conjunto da sociedade. A proposta da PEC 134 não traduz os esforços e as demandas das centenas de mulheres que concorreram a cargos eletivos nas comunidades periféricas do Brasil. Não atende aos anseios das que se candidataram no desejo de vocalizar demandas por direitos e vida digna. Não podemos mais aceitar um poder representado de forma desproporcional o masculino, branco, proprietário, cristão e hétero.

A Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, uma articulação de movimentos, entidades, fóruns e redes, que desde 2004 atua para mudar a forma como o sistema político brasileiro está organizado institucionalmente, defende a paridade de gênero e racial nas casas legislativas, a partir da ideia de que uma democracia representativa deve ser reflexo, de fato, da composição da sociedade brasileira.

Assinam esta nota:


Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político
Abong – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
Ação Educativa
Afipea-sindical
Alagbara:Articulação de Mulheres Negras e Quilombolas no Tocantins
Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB)
CAMP – Escola de Cidadania
CEDAC RJ
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará – CEDENPA
Centro Feminista de Estudos e Assessoria
Coletivo aBertha
Comunidade Eclesial de Base Fortaleza Ceará
FAOR Fórum da Amazônia Oriental
Gabriel Gomes Cardoso
IMUNE-MT Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso
INESC Instituto de estudos socioeconômicos
Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – Ibase
Instituto de Mulheres Negras do Amapá
Instituto IDhES
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
LBL – Liga Brasileira de Lésbicas
Mesa Brasil da Plataforma Mercosul Social Solidario
Meu Voto Será Femininsta
Micilda Machado
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Núcleo de Solidariedade Técnica – Soltec/UFRJ
Oorun Obinrin:Instituto da Mulher/Tocantins
Pastoral da Juventude do Meio Popular REGIONAL NE1 CEARÁ
Pastoral da Juventude do Meio Popular- Nacional
PJMP Nacional
Rede de Engenharia Popular Oswaldo Sevá
Rede Nacional de Negras e Negros LGBT
REDEH – Rede de Desenvolvimento Humano
Renfa – Rede Nacional de Feministas Antiproibicionista
Secretaria municipal de Mulheres do PSB João Pessoa
SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia
Terra de Direitos